sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Cem Dias Sem Economia

Findos cem dias de governo liderado por João Lourenço, apesar da abertura política, nada mexeu no campo urgente da economia. O problema é interno: a economia angolana tem um carácter rentista e cartelizado. E não se viu ainda qualquer movimento de destruição desses cartéis, nem a criação de condições para gerar concorrência e abrir novas empresas.
por PAULO ZUA
LER TEXTO INTEGRAL:
O presidente da República João Lourenço comemorou os cem dias do seu governo com uma entrevista colectiva, onde expôs as suas ideias sobre vários assuntos. O momento foi simbólico, e acredita-se que terá marcado, apesar das suas limitações óbvias, um novo momento no processo de abertura e descompressão na sociedade angolana, que Lourenço anuncia querer desenvolver.
Contudo, na óptica da economia, os cem dias de João Lourenço não adiantaram muito, e talvez tenham complicado um pouco a situação no médio prazo.
De positivo, o presidente da República criou um novo ambiente institucional, que lhe valerá alguma tolerância renovada por parte das organizações internacionais, designadamente o FMI (Fundo Monetário Internacional). Talvez seja agora mais fácil negociar as condições de um novo empréstimo desta instituição, caso seja necessário. De alguma maneira, em termos internacionais, foi criado um espaço de manobra para Angola.
Acresce que o preço do petróleo já anda na ordem dos US$ 70,00 por barril na referência usada para Angola, o que está longe dos US$ 40,00 que tinham lançado o país numa grave crise de tesouraria.
Portanto, ao nível da economia internacional, existe alguma bonança.
O problema reside internamente. A principal fragilidade da economia angolana é o seu carácter rentista e cartelizado. Quer isto dizer que a economia está dominada por monopólios sectoriais ligados aos detentores do poder político, os quais, por não terem concorrência, praticam preços muito elevados, vivendo de rendas e não de uma organização empresarial eficiente.
Até ao momento, não se viu qualquer movimento de destruição desses cartéis instalados um pouco por toda a economia, nem a criação de condições para gerar concorrência e abrir novas empresas. Da banca aos automóveis, passando pelo grande retalho, era preciso desobstruir a economia. Mas nada aconteceu.
A reforma da economia em Angola tem necessariamente de passar por duas etapas. A primeira é metodológica e passa por criar estatísticas e bases de dados fiáveis. O facto é que, neste momento, os números que existem sobre a economia angolana são essencialmente vudu. Podem ou não corresponder à realidade. Não se sabe. Para começar, é então necessário capacitar tecnicamente o Estado para, através de estatísticas adequadas e fiáveis, avaliar a economia e definir o que é preciso fazer.
A segunda etapa é a já referida abertura do mercado angolano à competição. Tem de existir um enquadramento legislativo e uma vontade política que permitam o acesso de qualquer empresário aos vários sectores da economia e que eliminem as barreiras à entrada nos mercados.
Este aspecto concreto contende com os interesses dos grupos económicos de Isabel dos Santos, generais Kopelipa e Dino do Nascimento, e muitos outros dirigentes do regime, que aguerridamente impedem o desenvolvimento económico do País e que, aliás, foram recentemente denunciados pela antiga directora da Agência Nacional do Investimento Privado, Maria Luísa Abrantes.
Repare-se num exemplo, transversal a várias áreas da economia: “A” domina o mercado do cimento, não podendo haver importação do mesmo, e “B” precisa de cimento para construir um edifício. Então, “A” pode vender o cimento ao preço que bem entende, esticando-o até ao máximo que “B” conseguir suportar. Coloca o preço a 10, “B” compra; coloca o preço a 15, “B” compra, e assim sucessivamente.
Quer isto dizer que o cimento vai estar ao preço mais alto possível, sem que isso resulte de qualquer capacidade, qualidade ou mais-valia de “A”. “A” não tem de se esforçar, nem de ser produtivo, nem de inovar, nem de procurar as melhores tecnologias. “A” tem a venda assegurada. Eis a receita ideal para a estagnação económica.
Depois, o que vai fazer “B”, que compra o cimento a preços elevados? Vai construir os seus prédios e vendê-los a preços mais elevados.
Assim, o domínio do mercado do cimento leva ao encarecimento da habitação. Isto, por sua vez, faz com que só existam habitações para os mais ricos. Os pobres e remediados não têm dinheiro para comprar casas inflacionadas. Vão viver para os musseques.
O controlo da economia por uns poucos grupos de dirigentes políticos é de facto um dos principais obstáculos ao desenvolvimento económico em Angola, e têm de ser tomadas medidas políticas para o desmantelar.
Finalmente, o governo de João Lourenço tem de reflectir sobre temas prementes da estratégia económica angolana:
Deve continuar a implementar uma estratégia de substituição de importações? (Esta estratégia foi abandonada pelos países mais desenvolvidos, que procuram produzir aquilo que fazem melhor e comprar no estrangeiro o que é mais barato.)
Quais as áreas de produção em que Angola deve investir? E como criar uma base de produção agrícola e industrial mínima e sólida?
Tem sentido seguir a via da industrialização ou deve-se tentar dar o salto para uma economia de serviços, ambiente e informação? É isso possível em Angola?
Deve o Estado intervir na banca, para proceder à sua reestruturação, tornando-a eficiente e promotora do investimento?
E como promover o investimento? É preciso acabar com a intervenção da burocracia e dos poderes presidenciais e ministeriais nos processos de investimento. Enquanto esta intervenção existir, o investimento estará bloqueado.
Nos primeiros cem dias da nova governação, não houve resposta para estas questões. Surgirá ela nos próximos cem?
O presidente da República João Lourenço comemorou os cem dias do seu governo com uma entrevista colectiva, onde expôs as suas ideias sobre vários assuntos.
makaangola.org
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29 Comments
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Dinossauro JC Malanga Não devemos ser tão redutores e pessimistas, em relação ao futuro da governação de JLo, afinal passaram apenas 100 dias. Mas também é uma grande realidade, refletidas nesta publicação.
Ainda penso que nos falta alguma coerência nas análises sociopolít
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Edilson Rocsano II burro da merda, ainda vaa sofrer
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Reply23h
Alvaro Correia O senhor faz um comentario sincero da publicaçao acima, e tu sem fazeres o seu, dizes apenas q o senhor é burro, nao espere mudanças apenas em outros, mude voce tambem!
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Reply12h
Dinossauro JC Malanga Edilson Rocsano II A educação q recebi dos meus ancestrais, não me permite responder-te na mesma moeda, só lamento pela fraca interpretação q obtiveste da minha opinião.
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Ildefonso Jkc Mas o que ele já fez até hoje pra que mereça as minhas palmas? O problema é comigo (sarcasmo) ou sóis distraídos amais com pensamentos q mais e mais retardam o país confortando o roubo burocrático?
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Derovir Victor da Silva Nada muda em Angola, com estes governantes matumbos que não entende de nada de como governar um país,,,,porque Angola mais parece uma aldeia, infelizmente com estas desgovernação nunca sera uma nação...
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Eduardo Formal Viciados em reclamar
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Marlete Alexandre #Silva, estás bem certo.
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Domingos Amândio Tenho que concordar consigo.
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Arminda Canjamba Se enganei mbora!
Não muda nada. Foi tudo bem arquitetado para impressionar e granjear a confiança.
Quem votou no passado, cala mesmo a boca não lamenta. Bate palmas. 48 anos e ainda não conhecem vossos governantes...
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Reply18h
Fleiva Real Negro Quando Uma dama te da muito carinho no principio da relação podes crer que Vai te cornear Vai te lixar , A Porque J-Lo J-Lo exonerador implacável ele é sim #Assassino implacável da economia , totalmente decepcionado com este senhor!!!
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Lopes Durão Maldito o homem que confia no homem igual. Não quero ser pessimista, mais se de facto quisermos uma Angola JUSTA e ORGANIZADA, temos que deixar o comodismo. Ser persistente, exigente, de acordo as nossas convicções. Nos eludimos com as atitudes de JL, quando na verdade ele estava a cumprir apenas o seu dever estratega pra ganhar a confiança do povo. Quando na verdade não sabemos qual é a sua verdadeira equipa. Se as dúvidas começam a surgir, o melhor mesmo é por as emoções de lado pra não sermos vistos como hipócritas. Fica o meu conselho.
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Reply8hEdited
Paulo Caetano Bom artigo, mas não devemos ser muito pessimistas, até porque só decorreram ainda cem dias. Penso que as primeiras medidas para que tenhamos uma economia crescente já foram feitas, embora compreende-se que muitos pensam que o JLo deveria ter feito mais. Mas como diz mesmo o artigo passaram apenas cem dias.
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Reply3h
Pedro Henrique Acho como cidadão devemos dar um voto de confiança nessa nova governação, pelos menos estão implementar boas estratégias ou medidas que daqui alguns meses teremos resultados positivos.
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Ildefonso Jkc Mas o que ele já fez até hoje pra que mereça as minhas palmas? O problema é comigo (sarcasmo) ou sóis distraídos amais com pensamentos q mais e mais retardam o país confortando o roubo burocrático?Exonerou, exonerou (seus estúpidos) exonerar sem prestar contas serve de q? Não agia assim tbm o tio dele no jogo do mete tira (rouba aqui-mete ali)? Vossas mentes anãs é q estraga essa selva!
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Changó Arenoso J.lo preciso de mais um pouco de tempo para eu te concluir e te resumir por enquanto estou quase ao fim de te averiguar e analisar e dar o seu resultado, mas já estou a te desconfiar.
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Manuel da Piedade Os cem dias de governação de JLO, já houve muita evolução significa no seio do governo. Acredito que teremos muito mais ainda para ver.
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Leonel Morais Eu mesmo só estou aqui a me perguntar se dá para abastecer gerador com cuspe? Senão estou paiado, aquilo é ligo o gerador para ver jogo quando a bola sair fora desligo depois volto a ligar
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Crespo Pedro Pio João Lourenço é continação do Eduardismo,qual delfim fiel ao mentor
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Domingos Amândio Quando disse que as mentes, os cérebros de pessoas da oposição ou que não sejam do MPLA nunca participariam do seu governo, e o máximo que poderiam sonhar deveria ser chegar a diretor, e olhe lá, acabaram-se as minhas ilusões. Percebi claramente tratar-se de um "ser" igual a José Eduardo dos Santos e todos os governantes primatas do MPLA. Olhem um homem tão inteligente como Rafael Marques, e diversos outros quadros deste país. Todos estes nunca poderão contribuir para que este país se desenvolva, não importa quão geniosa inteligência possuam. O MPLA fará tudo sozinho, com seus "quadrados" corruptos e corruptores, viciados em poder e desgovernação. Este senhor desta forma vai unir o país em prol de um projeto de nação? Olha, eu sinceramente não compreendo o que tem dentro das cabeças dos governantes africanos. África é um continente de gente tão desunida que mete medo. Eles não estudam sequer as histórias das grandes nações do mundo, como tiveram que superar o divionismo partidário e partir para projetos de nação que envolvessem todos os cidadãos e hoje são superdesenvolvidos? Angola, com o MPLA no poder, jamais será Unida. Temos apenas um povo que se tolera, mas que não trabalha unido. É caso para se dizer que quando um angolano vê o outro a trabalhar e a desenvolver, ele tem inveja, não se junta ao seu próximo para trabalharem juntos, mas o seu desejo é mata-lo ou para-lo, PARA SER ELE A FAZER AQUILO. É isso que vemos no MPLA. Perdidos.
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Antonio Debrito Bonito texto. Apontar soluções e estratégias. Teremos que ser mais ousados. O acesso ao crédito com prazo mais dilatados. Sermos mais realistas e sobretudo fortalecer o sector financeiro. Que este não se guie por gastos imidiatos
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Edilson Rocsano II com MPLA no poder e o JLO rumo ao sofrimento , Quem votou no MPLA cala sua boca ate 2022
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Salomé JM 100dias nada novo
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