sábado, 17 de março de 2018

O fardo do escândalo das chamadas dívidas ocultas já gerou “novos pobres”

Dívidas escondidas criaram novos pobres

A conclusão é do Instituto Nórdico para África
O fardo do escândalo das chamadas dívidas ocultas já gerou “novos pobres” em Moçambique e esse fenómeno deve ser estudado com mais rigor, para se conhecer a profundidade do problema, considera uma análise intitulada “Lições aprendidas da crise da dívida”, feita por duas pesquisadoras do Instituto Nórdico para África (NAI).
“É provável que o número de pessoas pobres tenha aumentado nos últimos dois anos. Os fazedores de políticas e as agências de desenvolvimento devem trabalhar em conjunto para desenvolver as ferramentas apropriadas visando identificar estes ´novos pobres` e desenhar políticas apropriadas para os apoiar”, lê-se no estudo.
As pesquisadoras Cecília Navarra e Cristina Udelsmann Rodrigues não têm dúvidas de que o peso da dívida de 2,2 biliões de dólares secretamente avalizada pelo anterior Governo será suportada pela população moçambicana, que vê as suas condições de vida deteriorarem-se.
As famílias moçambicanas, assinala a análise, estão a ser directamente  assoladas pelo aumento dos preços, cortes orçamentais e retirada da ajuda pelos parceiros internacionais.
“É importante que se evitem decisões que possam prejudicar os pobres, o que pode acontecer se, por exemplo, forem feitos cortes na saúde e na educação, como forma de evitar prejudicar os mais necessitados”, lê-se no documento.
O estudo aponta as dívidas ocultas como uma história de mercados financeiros opacos e ineficientes.
Os sistemas legais no plano interno e internacional precisam de redefinir as regras e os instrumentos financeiros disponíveis para afastar incentivos perversos para os mercados, consideram as duas pesquisadoras.
Quem deve pagar o preço?
O estudo assinala que há uma forte corrente social que é contra a hipótese de o montante das dívidas ocultas ser pago pelo Estado moçambicano, o mesmo que pela população.
Muitas vozes, incluindo organizações da sociedade civil, religiosas e pessoas singulares consideram a dívida ilegítima e que Moçambique deve recusar pagar os encargos, cabendo às autoridades judiciais a identificação dos autores das dívidas.
As duas pesquisadoras citam um editorial do Financial Times que refere que há uma forte inclinação para a restruturação da dívida, mas seria errado que a população pague sozinha o preço. “Os cidadãos comuns moçambicanos entendem que as responsabilidades por esta dívida estão ao nível das instâncias políticas e internacionais e não conseguem antecipar o impacto total que terá na sua vida diária”, afirmam.
A análise assinala que o caso foi possível, porque em mercados financeiros opacos e desregulados, há fortes incentivos para os bancos proporcionarem empréstimos mesmo na falta de garantias e avaliação apropriadas.
Cecília Navarra e Cristina Udelsmann Rodrigues lembram que a dívida de 2,2 biliões de dólares colocou a economia do país num estado de choque e o dinheiro foi usado a pretexto de financiar as actividades da Empresa Moçambicana de Atum (Ematum), Proindicus e MAM, a primeira constituída para a pesca de atum e segurança marítima e as duas para a segurança marítima.
Na sequência do escândalo, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e os doadores internacionais cortaram as ajudas ao Orçamento do Estado, agravando a situação económica e financeira de Moçambique.
O caso colocou o país sob um severo programa de resgate do FMI, que está a implicar cortes generalizados nas despesas do Estado.
SAVANA – 16.03.2018

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